quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

MÁRCIO COSTA: SINÔNIMO DE POESIA


NÃO-SER
(Márcio Costa)

Atrás da porta era só a casa vazia e eu
Era só uma câmara escura e congelante
Onde vagavam neblinas escuras de lembranças e medo
Era apenas um infinito vazio gigante.

Depois da porta me diziam que era o mundo
Diziam-me que havia vida e matéria, não vi nada disso
Abaixo de um firmamento escuro e nublado
Abaixo de uma lua triste atrás de nuvens estranhas
Eu era um vagabundo.

Aquelas ruas não eram nada pra mim
Centenas de corpos almáticos sem rumo
Perdidos no tempo sem saber quem são
Sobreviventes de guerras e massacres
Achando-se fortes sem saber qual a razão
Aquelas ruas não eram nada pra mim.

Depois da porta não vi nada parecido comigo
Um fundamento perfeito que há muito tempo se perdeu
E não sendo mais perfeito, aos destroços continua
Um grande espaço deficiente e incapaz como eu
Depois da porta decidir ir ao infinito.

Sou agora um imóvel corpo gasoso fora de si
Não sinto, não vejo, não opino; inconsciente, desviado
Não sou do mundo nem do eterno, nem sou eu
Apenas é do mundo um velho corpo
Que pelo metal foi penetrado
Sou apenas um espaço vazio fora de si
Porque a razão de tudo se perdeu.



NÁUFRAGO
(Márcio Costa)

Em um vazio silêncio mórbido
Eu sou um náufrago.
Em um abismo escuro sem fim
Eu sou um náufrago.
Um espírito que vaga sozinho,
Nos mais tristes mundos ocultos,
Nas mais longas noites profundas
Eu sou um náufrago.
Afundo-me cada dia na tristeza
De um quarto fúnebre,
Onde procuro a cada dia um segredo,
Uma mágica pra ser eu vida,
Em um vazio sonho que não se realiza,
Em um triste desespero na vida.
Eu sou um náufrago
Cada parte de um possível futuro,
Cada hora de agonia sem cura,
Cada passo apressado ou bêbado
Nas calçadas.
Vejo no frio escuro
E nas mais situações e lugares
Eu não me acho,
Vejo-me apenas aqui
Numa noite longa de silêncio,
Num mar de ilusões do pensamento,
Em um silêncio sombrio de um quarto
Eu sou um náufrago.


VÍRUS
(Márcio Costa)

Propagação viral incurável
Percepção limpa resolução
Obediência imediata do cérebro
Regra variável
Poder do povo anunciado
Ótimo futuro nas promessas
Velocidade baixa
Enquanto o mundo tem pressa
Mais uma vez você foi burlado
Você teve o poder de dar poder
Esse poder foi superfaturado
E se não merecem a soberania
Você age pela democracia
Mas tem seu poder negado
Baixo teor de protesto
Ninguém percebe
Prefere calar
Propagasse o vírus
Obedecem sem falar
Uma tal constituíção
Que não passa de dejetos do poder
Pra te prender
Na desgraça dos problemas
Que não há de se resolver
Baixo teor de protesto
Na maior classe social
Sofrem calados
Mesmo necessitados
Por medo do poder    
Que não passa de uma doença:
Miasma cerebral.
 


UM ESTRANHO E UM CAMINHO
(Márcio Costa)

Segue-se um longo e estranho caminho
Algumas pegadas que ficam, outras se evaporam
A cada passo fica perdida uma ilusão
Criada onde o que se quer não se consegue
Segue-se a cada curva mais sozinho.
Segue-se um longo e estranho caminho
Entre veredas de escuro e solidão
Passados risos rarefeitos que se perdem
Futuros ouvidos não acharão a menor graça
Mas o tempo passa, a cada tempo mais sozinho.
Segue-se um lento e estranho a vagar
Sobre o chão não segue sua sombra
Não segue seus passos tardos, só o silêncio
Ao contrário percorre os passos de certo alguém
Segue-se lento, um estranho sem alento, a soluçar
Segue-se ao longo, um sentido distorcido
Por entre velas gigantes de ilusões e medo
Os outros o vêem a acham ser o mesmo
Mas o fantástico interior nunca pode ser visto
Segue por ali um estranho
Que pode nunca ter vivido.



AUTO DESCRIÇÃO
(Márcio Costa)

Meu nome é ninguém
Sou um vulto triste
A vagar pelos becos da imaginação
A procura de uma certa felicidade
Mesmo que dure um minuto
Mesmo que seja ilusão
Sou um mero solitário
Vagando em volta do mundo
A procura de alguém...



VOLÚPIA
(Márcio Costa)

Face lívida, linda, que engana
Corpo irresignável
Tentação alucinógena
Que deixa nojo no fim e finda
Ainda que tarde
Haure
Um ser límpido
Unge com lodo.

Face ignominiosa
Esconde falsa opulência emotiva
Ludibriosa
Falsa imagem do aprazível
Desprezível
Existência retrógrada
Desejo excêntrico do ser
Que muitos tentam viver.




SENTIMENTO DE UM VELHO NA CIDADE
(Márcio Costa)

O vôo de um bando de pássaros
Num dia azul qualquer
Faz-me lembrar dos velhos verdes campos
do meu lugar.
As belas flores vermelhas, azuis , amarelas,
Os sagüins, os pássaros, o luar.
Lá a gente podia ver as estrelas alegres piscando tão belas

O vôo de um boeing no aeroporto
Num dia cinzento qualquer
Cecado pelo concreto morto
Traz-me não sei que desgosto
E um desejo de estar
Nos velhos verdes campos do meu lugar.


TENTATIVA VÃ DE DESCREVER A ESTRANHA COISA CHAMADA AMOR
(Márcio Costa)

Como são os seus olhos
Vistos por meus olhos?

E como são os meus olhos 
Vistos por seus olhos?

O que sinto ao ver seus olhos?
E o que sente, você, ao ver meus olhos?

Passei uma hora tentando entender,
descrever e escrever...

Agora concluí que tudo isso é intendível,
indescrevível e inescrevível.


MODERNIDADE
(Mácio Costa)

A modernidade apagou as cores,
Mais almas dormem nas calçadas,
Preferem hegemonias a coisas variadas.
Antes éramos felizes,
Dançando ao som dos tambores,
Sem grandes dores.

A modernidade matou a alma,
Eles destroem a si próprio
Na busca utópica pela perfeição.
Consideram-se inteligentes máquinas
Emergida de corpos celulares do miasma,
Surgido da grande explosão.

Corridas espaciais,
Corridas armamentistas.
O que há além do sol
Mais belo do que a terra?
As nações se destroçam por lucros,
A inocência perece na guerra.

A modernidade cobriu o sol
Com a fumaça do futuro,
A modernidade fundirá a vida 
No fogo da última grande invenção.



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